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Campanhas, manipulação e folclore político

Por trás da máquina eleitoral dos partidos políticos há um universo desconhecido.

20.11.15 - 00h00

Com Gonçalo Bordalo Pinheiro e João Tocha, a conferência "Táticas das Campanhas Eleitorais" permitiu vislumbrar os bastidores do marketing político. E as histórias deixaram boquiaberta uma audiência para quem o Auditório Armando Guebuza foi pequeno.

Andar à procura de uma perna enquanto se diz ao candidato presidencial que "não se passa nada". É incrível? Mas aconteceu, em 1996. Gonçalo Bordalo Pinheiro é jornalista político e foi diretor-adjunto da revista Sábado durante nove anos. Na conferência "Táticas das Campanhas Eleitorais", organizada pelo Departamento de Ciências da Comunicação, na Lusófona, a 29 de outubro, revelou como funcionam os bastidores dos partidos políticos em campanha.

Regressando a 1996, um acidente no interior do país fez parar a caravana de Jorge Sampaio. Um dos carros tinha embatido numa mota, que saíra da estrada. Com o condutor inconsciente, Bordalo Pinheiro contou que o assessor de imprensa de Sampaio fez de tudo para não preocupar o então candidato à presidência enquanto tentava atenuar os danos. Quando soube que o motociclista tinha perdido uma perna, ligou de imediato para o hospital mais próximo solicitando que preparassem uma equipa de reimplante. O problema era ninguém encontrar o membro perdido no meio da mata densa.

Depois de muito pânico, o acidentado recuperou consciência e explicou que tinha perdido a perna, sim, mas sete anos antes. Esta história bizarra é, para Gonçalo Bordalo Pinheiro, exemplar das peripécias de uma campanha e mostra a força do aparelho partidário e do porquê de não se poder acreditar num assessor.

Média também são culpados

O jornalista referiu outros casos de manipulação durante as campanhas políticas, dando como exemplo recente a polémica que envolveu o PS nas últimas legislativas. Cartazes que mostravam supostos desempregados, retratavam, afinal, militantes socialistas que desconheciam o destino das suas fotografias. Para o jornalista, "estas manipulações dos partidos em campanha só ajudam a desacreditá-los".

Mas o antigo diretor-adjunto da Sábado, também não poupou os seus pares. Os média, disse, têm culpa nas campanhas manipuladas dos partidos. Bordalo Pinheiro usou o exemplo das arruadas onde, por vezes, não estão "mais de quinze pessoas".

"As Juventudes Partidárias começam por fazer uma pesquisa acerca da rua mais favorável ao partido, depois os membros da 'jota' seguem o candidato, distribuindo e agitando bandeiras, parecendo sempre que há muitas pessoas", explicou o jornalista. Apesar disso, as televisões "não se esforçam para mostrar um plano mais alargado" que revele a situação real. Deixam, assim, "os telespectadores a pensar que este candidato tem uma grande legião de seguidores, 'caindo' na manipulação".

Como perder eleições?

João Tocha, consultor político e gestor da First Five Consulting, discorda do retrato desenhado por Gonçalo Bordalo Pinheiro e responsabiliza os "maus profissionais" pelas situações descritas. "Eu não trabalho assim", deixou claro. Com um conhecimento profundo do que fica para lá do visível nas campanhas políticas, Tocha apostou na ironia, interrogando-se sobre quais as regras a seguir para um partido perder as eleições.

Para o consultor, essas regras são dez. Contactar os cidadãos só durante a campanha é uma delas. Esquecer o programa eleitoral para se focar no folclore político é outra. Mas existem mais pecados mortais. Destacam-se a pouca preocupação com o passado, como se tudo na vida tivesse sido até ao momento imaculado, o desinteresse em explicar o que se quer, e não deixar alguém organizar a agenda.


Para lá do folclore político

Contrariar estes fatores negativos é o que faz uma campanha de sucesso, que se diferencia do folclore e da manipulação do marketing eleitoral, disse. Em Portugal, o profissionalismo político está muitas vezes ausente. João Tocha explicou, por exemplo, que os políticos "não têm o cuidado de fazer uma base de dados própria e sobre os adversários, o que os faz cair em contradições e não aproveitar os deslizes" dos outros candidatos.

Para o consultor, se os políticos mostrarem trabalho, conhecimento e se afastarem do mediatismo vazio, conseguem o respeito da população. Exemplo disse é Mariana Mortágua, que chegou praticamente a vice-líder do Bloco de Esquerda através do seu "trabalho e credibilidade, mostrado na comissão de inquérito ao caso BES".

Em jeito de conclusão, o "Homem-telemóvel" - alcunha dada a João Tocha pelo jornal Público -, disse que os factores determinantes de uma campanha são "uma boa liderança, um bom programa e boa organização". A concentração é também essencial e o consultor demonstrou-a durante as mais de duas horas concorridas da conferência: manteve-se sempre alheado do objeto de que supostamente é inseparável e que lhe valeu o rebatismo por parte do diário.

João Alves
Redação LOC

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